Acredito que alguns livros não deveriam ser lidos. Não até o fim, pelo menos. Não por todo mundo, quero dizer — essa regra vale para mim. E não que haja qualquer coisa de errada que seja com esses livros em particular, e nem que eles devam ser proibidos. É algo mais como “eu não preciso de fato ler isso aqui”.
Lembro de quando decidi que deveria ler Fundação. Faz um par de anos. Considerado uma das obras primas de Isaac Asimov, Fundação se inspira na obra de Edward Gibbon — que escreveu um dos meus livros favoritos — para contar a história de que providências a humanidade iria tomar depois que previsse o próprio fiasco. E é essencialmente isso o que eu retive da história: uma sinopse curtíssima.
Mas tem uma coisa a respeito desse livro que eu me lembro muito bem, e posso descrever em detalhes. Lembro como se fosse hoje da minha reação ao avançar lentamente através de cada uma das páginas de papel jornal da minha edição. Havia comprado tanto este volume quanto o Prelúdio à Fundação numa promoção de 1 dólar na Better World Books, mas sofri quando os livros chegaram por causa do nível do meu inglês. Outro par de anos mais tarde perguntei sobre a série a alguns amigos que a tinham lido, e finalmente decidi que me aventuraria nos livros pela sua ordem de escrita*.
Acho que o processo todo entre tomar a decisão, pegar o livro nas mãos, e posteriormente depositá-lo na estante lido levou aproximadamente um mês, talvez um pouco mais. E me pareceu muito mais que isso. Cada vez que eu tirava o livro da bolsa, tinha que me convencer de que aquela era uma obra importante e que, se eu me dizia uma fã de ficção-científica, era minha obrigação lê-lo. Só que o livro é muito chato. Muito, muito chato. Me pegava pensando: “Meu deus, quando esse tormento vai acabar?”. Assim, desenvolvi algumas estratégias para manter a atenção na leitura: reparava na quantidade de tempo que se pulava entre uma parte e outra, contava quantas eram as personagens mulheres e qual o papel delas na trama, grifava os trechos em que Asimov conceituava ou retratava o papel social da tecnologia**, notava como era retratado o líder, esse tipo de coisa.
Não adiantou. Tive algumas boa idéias durante a leitura, cheguei a algumas conclusões a respeito do Asimov enquanto escritor, mas o que me sobrou da narrativa e do enredo propriamente ditos foi algo próximo de nada. Ler Fundação foi um processo tão cheio de sacrifícios para conseguir me manter atenta na leitura que não consegui extrair nada de bom do livro. Fiquei pensando na minha empolgação ao ler Eu, Robô alguns anos antes, o punhado de contos aleatórios que pegava na internet de vez enquando, e o sentimento era bem oposto. O que raios o Asimov tinha feito em Fundação que tinha tornado o livro o fenômeno cultural que era, se ele (o livro) era tão profunda e absolutamente chato?
Pouquíssima gente que conheço havia de fato lido essa saga do escritor cuja personalidade resume tudo o que há de errado no chamado “universo nerd”. Existem poucas pessoas com quem conversar a respeito das impressões de leitura. Nem por essa experiência paralela, que para mim é uma das mais interessantes quando se trata de consumir algum tipo de obra de arte, Fundação tinha valido a pena. De que maneira eu poderia aproveitar todo esse tempo perdido?
Guardei o livro de volta na estante. Quanto ao Prelúdio, sequer abri. Não preciso continuar lendo isso.
*É uma regra sagrada para mim, que estabeleci ao longo da vida: sempre que me deparar com uma série não-linear, seguir a ordem de publicação. Não sei explicar exatamente o porquê, mas me sinto menos enganada dessa forma.
**Fiz mestrado em uma área interdisciplinar conhecida como Ciência, Tecnologia e Sociedade, uma mistura de história, sociologia, filosofia, design e outras áreas de abrangência indefinida que prega a construção social da tecnologia. A mocinha daquele vídeo descreveria a área com os únicos adjetivos possíveis: “bem louco” e “empolgante”.
Até a segunda parte é até interessante, mas quando começa a falar da trama dos comerciantes é insuportável.
Você me entende!
Bem por aí. Eu já tentei ler a coisa toda duas ou três vezes, e até passei dessa parte dos comerciantes na primeira, mas parei logo depois da parte do Mulo e não peguei de novo.